Criei este blog enquanto instrumento de aproximação às cidadãs e aos cidadãos. É um conceito simples que visa partilhar os percursos, o trabalho e a visão das coisas de uma mulher, cidadã, politicamente comprometida no exercício da sua primeira experiência parlamentar e conhecer as opiniões e sugestões de quem me contacta, por exemplo, as suas.

A José Nascimento e António Barbosa agradeço respectivamente, a fotografia e a música.

Portugal e os portugueses


 
As palavras que a escritora Marguerite Yourcenar escreveu no pós-guerra, em "Memórias de Adriano", são de uma atualidade arrepiante.” Nunca prestei grande atenção às pessoas bem intencionadas que dizem que a felicidade excita, que a liberdade enfraquece e que a humanidade corrompe aqueles sobre quem é exercida” . Pode ser, mas, no estado habitual do mundo, é como recusar a alimentação necessária a um homem emagrecido com receio de que alguns anos depois ele possa sofrer de superabundância.

Portugal parece ter sido atingido por uma espécie de moral regeneradora, ouvem-se discurso proféticos que  ditam que a luxúria e a abundância que têm marcado  a felicidade dos portugueses vão ser erradicadas para dar lugar a uma sociedade onde a liberdade e a humanidade assentam na disciplina e austeridade. Só que essa carapuça não serve a um povo que nunca viveu na opulência e quando começou a ter uma vida melhor, disseram-lhe "Basta".  Mas não é isto que verga os portugueses. A verdade é que a cada dia que passa é mais visível o estado de emagrecimento da sociedade portuguesa. Portugal está a entrar num estado mórbido de anorexia forçada e gravemente devastadora.

Recordo aqui as palavras que ouvi recentemente  ao escritor António Lobo Antunes e que dão conta da dignidade desta gente. Durante o período em que andou a fazer tratamentos no Instituto Português de Oncologia, encontrou um homem dos seus 80 anos, que todas as semanas ia de Barrancos ao IPO, a  Lisboa. Apesar do seu ar humilde e doente, não prescindia do seu velho fato e gravata. Este homem nunca perdeu a compostura, para o escritor ele representa a dignidade do povo português. 

É essa dignidade que os nossos governantes não conhecem. Por isso, não disfrutam de condições para valorizar as dificuldades deste povo. Dizia um banqueiro que aguentamos mais austeridade. Talvez tenha razão, porque este povo já demonstrou que é rijo e tem instinto de sobrevivência. Basta pensar que com pão e ervas se faz uma açorda. No entanto, o que esse banqueiro não demonstrou é como é que ele sobrevivia a um plano de austeridade que, de um dia para o outro, colocasse em causa os seus investimentos e planos pessoais. Ele esqueceu-se de outro pequeno grande detalhe: neste momento atirar mais austeridade para cima do povo português  é como recusar a alimentação necessária a um homem emagrecido com receio de que alguns anos depois ele possa sofrer de superabundância.

Portugal precisa de visão e de liderança do seu povo. O nosso país, necessita de medidas credíveis de consolidação das políticas públicas, adaptadas ao contexto, e não de medidas que desmantelem o sistema produtivo, assente em pequenas e médias empresas que fecham porque a tributação aumenta e o consumo baixa na sequência da desvalorização da força de trabalho.

Portugal precisa de um Estado eficiente que acabe com a paralisia administrativa, com a burocracia opaca que contribui para a discricionariedade das práticas, de acordo com os poderes e interesses instalados. Só um Estado mais ágil, que se identifique com as pessoas, com as necessidades dos investidores e dos territórios, pode acabar com o autoritarismo tecnocrático que ignora as assimetrias regionais que separam Lisboa de Barrancos.

Portugal precisa de condições para o crescimento económico, precisa de tempo para crescer. Este povo precisa que respeitem a sua dignidade e que seja conduzido pelos caminhos da esperança, do trabalho e do futuro risonho para os seus filhos.

 

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