Criei este blog enquanto instrumento de aproximação às cidadãs e aos cidadãos. É um conceito simples que visa partilhar os percursos, o trabalho e a visão das coisas de uma mulher, cidadã, politicamente comprometida no exercício da sua primeira experiência parlamentar e conhecer as opiniões e sugestões de quem me contacta, por exemplo, as suas.

A José Nascimento e António Barbosa agradeço respectivamente, a fotografia e a música.

Relatório das audições efectuadas sobre portugueses ciganos


O Presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, Vitor Martelo (ao centro) e o Director Regional de Educação do Alentejo, José Verdasca, acompanhados por profissionais de acção social e professores que trabalham com a comunidade cigana num projecto reconhecido como uma boa prática.




Apresentação pública do relatório das audições efectuadas sobre portugueses ciganos no âmbito do ano Europeu para o Diálogo Intercultural



Comissão Ética, Sociedade e Cultural

SUBCOMISSÃO DE IGUALDADE DE OPORTUNIDADES E FAMÍLIA


As coisas são como são mesmo quando não as conhecemos, é o que acontece com a comunidade cigana que existe em Portugal desde há 500 anos. Ao longo dos tempos uma parte dessa comunidade conseguiu romper com a pobreza, autonomizar-se e assumir um papel activo na sociedade. Esta comunidade, caracterizada pela heterogeneidade, tem pouca visibilidade, refém de uma série de preconceitos e estereótipos, tende a fechar-se sobre si própria.


Devido à minha ligação ao concelho de Alandroal, desde sempre ouvi falar das famílias ciganas que vivem na aldeia de Santiago Maior, como comerciantes respeitáveis e bons vizinhos, o que acontece por este País fora. Actualmente, já existem ciganos autarcas, professores, investigadores, etc. Mas a realidade é que uma percentagem muito significativa continua a viver à margem da sociedade, com muita dificuldade em se integrar. Destas pessoas chega-nos geralmente informação sobre as suas piores práticas.


Em 2008, integrei o grupo de Deputados da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família que, no âmbito do ano Ano Europeu do Diálogo Intercultural, realizou um amplo conjunto de audições e visitas no terreno, com o objectivo de conhecer melhor esta comunidade conhecida pela sua extrema vulnerabilidade e pobreza. Desta forma, procura-se contribuir para uma maior aproximação entre os portugueses ciganos e os cidadãos portugueses, em geral. Na expectativa de contribuir para um melhor conhecimento destas gentes, deixo os dados seguintes.


Em Fevereiro, de 2009, recebiam o RSI 5270 famílias, 3,9% da totalidade da população que recebe o RSI. Face à dispersão e mesmo ausência de dados sistematizados sobre a comunidade cigana, este dado permite-nos perceber que por um lado, apenas temos conhecimento de uma pequena percentagem da população cigana, constituída por cerca de 50.000 ciganos, e por outro lado, que conhecemos sobretudo a população que vive em situação de pobreza e que representa apenas cerca de 5% dos ciganos portugueses, muitos ciganos que estão integrados tendem a encobrir a sua própria identidade com medo de serem discriminados.


Em geral, a comunidade cigana tem menos quinze anos de esperança de vida do que a generalidade da população. A mortalidade infantil é cinco vezes superior à média europeia. Saliente-se que Portugal é o segundo País com menor taxa de mortalidade infantil no contexto europeu.

Por último, actuamente apenas uma reduzida parte dos ciganos portugueses são nómadas.


Comentários ao Relatório

Destaco algumas notas das intervenções proferidas pelas personalidades convidadas para comentar o relatório decorrente do trabalho efectuado por Deputados e Deputadas da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família e elaborado pela sua Presidente, Deputada Maria do Rosário Carneiro.

Alexandra Castro - Socióloga e investigadora

O relatório sobre a comunidade cigana…

…coloca uma questão central de cidadania em Portugal.
…é um olhar atento sobre diversas áreas das políticas públicas.
…rompe com a ideia do carácter homogéneo da população cigana.


A exclusão social é o resultado de um desencontro entre uma sociedade de oportunidade e as capacidades e competências das pessoas, dos grupos e das comunidades. O processo Europeu de inclusão social da população cigana está em marcha. A União Europeia definiu 2005-2015 como a década para a inclusão dos ciganos, é necessário que Portugal apresente a sua agenda para esta área.

Carlos Miguel - Presidente da Câmara de TorresVedras

É muito importante pela abertura que expressa em conceitos e em preconceitos sobre uma realidade não estudada em termos globais. Destacou partes do relatório, nomeadamente na área da educação considerando que…

…A escola é um instrumento aglutinador que não se pode desperdiçar. É fundamental o apoio das autarquias, dos ministérios sectoriais, das empresas, todos articulados em rede.

…A escola é fundamental para a integração das crianças ciganas. A educação é um instrumento essencial para o seu empoderamento.

O problema também é da comunidade cigana, do seu fecho às oportunidades que existem. A comunidade cigana auto-excluísse com medo dos preconceitos. As pontes a construir exigem o reforço do papel dos mediadores, são estes os engenheiros das pontes a estabelecer.


A grandeza deste relatório advém de ter sido feita por Deputados da Assembleia da República. Na alínea c) do art. 161º a Assembleia é desafiada a produzir legislação que abra caminhos de inclusão. Os passos a dar não são pelos ciganos, são por um Portugal inclusivo.


Terminou com uma referencia do Dr. Carlos Miguel a uma afirmação de D. Juan Ramirez-Heredia “O que é ser cigano? Cigano é aquele que quer ser cigano”.

Esta afirmação, simples e despretensiosa, suscita-me a questão da identidade da cultura cigana. Creio que a própria comunidade cigana tem de fazer um esforço no sento de transmitir o que de facto caracteriza este povo para que melhor se compreendam os riscos inerentes a um processo de aculturação que podem advir da sua integração na sociedade maioritária.

Juan de Dios Ramirez-Heredia - Presidente da União Romani Espanhola


Não precisei de ler nos livros o que é a marginalização, a pobreza, toda a minha vida vivi numa família cigana, não sabiam ler nem escrever mas tinha orgulho em ser ciganos.


Somos ciganos e temos orgulho em querer continuar a ser cigano. Como é que é possível que os 14 milhões de ciganos de todo o mundo, 10milhões repartidos por toda a Europa, um povo inculto, analfabeto, ocupando um último lugar do desenvolvimento e do progresso, ainda não tenham desaparecido?


Para que os estudos que se realizam sobre este povo e os programas que existem, tenham o mínimo de validade, os próprios ciganos têm de participar na sua construção, têm de dar espaço ao protagonismo dos ciganos.

Exagerando… “Basta de estudos que não servem para nada, peguem-lhe fogo e aquecem os ciganos que têm frio.”

Precisamos de ganhar os meios de comunicação para esta batalha.

Os ciganos enriquecem a cultura da sociedade maioritária.

Que este relatório seja a semente.

(PS: O registo destes comentários procura reproduzir de forma fiel as palavras dos oradores.)


Termino, na convicção que o trabalho desenvolvido por Deputados e Deputadas da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família não é o princípio de tudo, há muito que está a ser feito trabalho no terreno como se prova pelas experiências relatadas nas audições, por profissionais ligados tanto ao sector público como às organizações da sociedade civil, mas é um contributo político para uma sociedade mais inclusiva.

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