Criei este blog enquanto instrumento de aproximação às cidadãs e aos cidadãos. É um conceito simples que visa partilhar os percursos, o trabalho e a visão das coisas de uma mulher, cidadã, politicamente comprometida no exercício da sua primeira experiência parlamentar e conhecer as opiniões e sugestões de quem me contacta, por exemplo, as suas.

A José Nascimento e António Barbosa agradeço respectivamente, a fotografia e a música.

Violência Doméstica - As Mulheres

Mulheres em cativeiro


Existem diferentes formas de cativeiro e nenhuma delas é boa.

Falamos de quê? Do silêncio em que vivem muitas mulheres, prisioneiras em torres de vidro. Cruzamo-nos com elas no supermercado, onde circulam um passo atrás do carrinho de compras empurrado por maridos que decidem o que entra em casa, inclusive o que a família come ou não come. No emprego a coisa é ainda mais difícil de reconhecer, para uma mulher é mais fácil justificar uma noite de violência psicológica ou física, uma enxaqueca ou uma queda azarada.

As coisas acontecem e nós não nos damos conta. A mulher acaba por viver fechada em si própria, a discrição dos seus movimentos (justificada pela vergonha e pelo medo) faz com que ninguém se aperceba do cativeiro em que vive. No entanto, ela está ali, na fila para a caixa do supermercado, sentada na secretária ao nosso lado ou na imagem refletida no espelho à nossa frente. Acontece a mulheres de todas as idades e condições socioeconómicas.   

Às vezes tudo começa com um comentário (aparentemente) desinteressado da parte do marido/companheiro, com o objetivo de desvalorizar a mulher e que repetido de forma continua, com diferentes nuances, produz o efeito pretendido: uma baixa autoestima por parte da mulher, tornando-a vulnerável e mais fácil de controlar. A subtileza das atitudes acaba por tornar as coisas confusas e levar a vítima a acreditar que é culpada das reações do agressor, mesmo quando racionalmente sabe que não tem culpa.

Outras vezes tudo acontece entre um tom de voz grave, às vezes ameaçador, e uma expressão de (quase) ternura. Desta forma cria insegurança no outro que nunca sabe se o seu comportamento merece ser punido ou premiado. A violência é psicológica. A vítima está sempre na expetativa que as coisas mudem. Ainda não perdeu a esperança. Um dia a coisa complica-se. O marido/companheiro bate-lhe. Depois mostra-se arrependido ou não. A sua atitude é justificada com as próprias reações da mulher, com os ciúmes que diz sentir ou com os problemas no trabalho, qualquer razão serve.

Muitas vezes é o fim. Tudo acaba com um suicídio. E raramente se saberá o que o motivou. O cativeiro termina em silêncio, tal como começou e permaneceu durante anos. Outras vezes acaba com um homicídio, resultado de anos de violência ou de uma tentativa de separação, por parte da vítima, que visa pôr termo a um ciclo de sofrimento.

As descrições que fiz são aproximações a uma realidade complexa, policromada, que se esconde na sombra das relações entre as pessoas. E se é verdade que as vítimas de violência doméstica também podem ser homens, na realidade, a esmagadora maioria são mulheres. Enquanto este tormento durar devemos assinalar o Dia Internacional da Mulher, vestidos de preto.

Bem hajam todas as pessoas que respeitam os Direitos Humanos das Mulheres e dos Homens.   
 
 
in Jornal Diário do Sul, março 2015




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